Memórias
de Maria
Nasci
em meio a um conflito social e religioso, sempre observei sem entender muito
bem, porque é que os homens queriam muito mais do que aquilo que necessitavam
para viver. Me sentia fraca, magrinha, me colocaram apelidos na escola, sofri
imensamente com isso, como menina caprichosa que era, queria mudar o meu corpo,
meu cabelo, minha pele, meu nome...ah meu nome, Maria, tão comum, nome de
muitas amas de leite, de boias frias, mas eu não poderia mudar nada daquilo que
acabei de citar, mas sei que poderia mudar o meu destino...
Eu tinha muitas amiguinhas,
professores, vizinhos, mesmo assim me sentia sozinha e essa solidão eu só
preenchia lendo livros. Livros que eu não tinha, mas que eu emprestava na
biblioteca e para chegar lá andava muito a pé, livros que eu amava que me faziam
viajar, conhecer cidades grandes, conhecer gente rica, culta, importante, ah um
dia eu iria conhecer essas coisas do mundo.
Segui a vida, cheia de sonhos e de
dificuldades também, cresci vaidosa, já não me achava mais feinha e sim linda
maravilhosa, sabia que não tinha nem calçado para usar, se me faltava o básico
como é que eu iria entrar na universidade, ser doutora, advogada, falar uma
língua estrangeira, pensei até em me casar com um gringo, mas não foi bem
assim...
Casei com um agricultor, homem rude
de poucas palavras, quieto, não gostava de nada, acho que não gostava nem dele
mesmo. Morreu novo, fiquei viúva aos vinte e um anos, com quatro filhos e uma
pensão bem magrinha.
E os meus sonhos... morreram... não
adormeceram... nem lê eu não lia mais. De repente acordei, criei coragem,
decidi realizar,. Meus filhos sempre ao meu lado, não penso em deixá-los
jamais, quero que tenham uma vida melhor que a minha, e foi pensando neles, que
eu ressurgi das cinzas. Acordei, a vizinhança me chamou de louca quando resolvi
pegar os meus quatro filhos e mudar para uma cidade maior.
Voltei a estudar, arrumei emprego,
entrei na faculdade, vi meus filhos crescerem bem, me transformei,
realizei os sonhos esquecidos, curei as feridas da dor, enquanto outras se abriram,
resolvi os problemas antigos e sofro com os recentes, enfim... várias Marias na
vida deixei.
Professora Saionara Mazzochin
Encontro dos professores da área de linguagem realizado no Cefapro-Matupá, formação a respeito das Olimpíadas de Língua Portuguesa.